quinta-feira, 19 de junho de 2008

A história do menino que fugiu de casa e foi morar embaixo da ponte

– Diga logo Cantador
O que foi que aconteceu.
Digue logo, por favor,
Como foi que aconteceu!...
Meus amigos, quem vos fala
É o cantador de cordel.
Quando uma idéia me estala,
Vou passando pra o papel.

Eu levo a vida cantando
Pro povo da minha terra,
Histórias que vou lembrando
Dos causos que a vida encerra.

Apareceu um garoto
Pras bandas do meu nordeste.
Um cabra de tão maroto,
Mais parecia uma peste.

A mãe não tinha mais jeito,
Vivia encabulada.
Um dia pegou o tal sujeito
E sapecou umas palmadas.

O tal de anjinho sem asas
Não gostou das gentilezas.
Resolveu fugir de casa,
Levar vida na moleza.

Acordou de madrugada,
Antes do galo cantar.
Botou o pé nas estradas,
Deixando a mãe a chorar.

Veio parar na cidade
Sem ter lugar pra morar.
Passando necessidade,
Aprendeu a trabalhar.

Nesta cidade perdido
Carregando seu segredo,
Sem ter nenhum conhecido
Passou fome, frio e medo.

Sem encontrar moradia,
De uma ponte fez abrigo
Mas muita falta sentia
De um verdadeiro amigo.

A um moço desconhecido
Que um dia pediu pousada
Ele deu casa e comida,
Fez seu novo camarada.

Mas um dia descobriu,
Só por casualidade,
Que o rapaz que ele acudiu
Vinha da mesma cidade.

Ai meu Deus, quanta alegria
Daqueles cabras da peste.
Conversaram todo o dia
Das coisas lá do Nordeste.

O amigo lhe disse, então,
Da falta que ele fazia.
Da tristeza no sertão,
Do quanto a mãe padecia.

Ele então, arrependido
De fazer a mãe chorar,
Sabendo que era querido
Pra casa quis regressar.

Empreendeu logo a viagem
Que tantas vezes sonhara:
Cinco dias de estiagem
Em riba de um pau-de-arara.

Meninos, chegou o dia,
Faltou lugar no sertão
Pra caber tanta alegria,
Pra guardar tanta emoção.

A mãe abraçando o filho
E o filho com a mãe do lado.
Nos olhos tamanho brilho
E o coração abrasado.

Depois de tudo passado,
A mãe a Deus foi rezar
Por ter um cabra safado
Virado um filho exemplar.

Meus amigos, tendo em vista
Que a hora vai adiantada,
Se despede o repentista
Depois da história contada.

Alberto Centurião
São Paulo, 1981

domingo, 15 de junho de 2008

O rio e a cidade

O rio dá vida à cidade
E a cidade mata o rio.
Vejam que atrocidade,
A cidade mata o rio.

Alberto Centurião
Sampa 2000
Da peça “O último programa de Cubanacan”