Tem doença
que mata
e doença que
maltrata.
Tem a que
maltrata e não mata
e a fatal,
definitiva, que mata sem maltratar.
Tem ainda as
mais cruéis,
que matam
devagarinho,
por gosto de
maltratar.
Doença de
qualquer tipo
a gente não
quer passar.
Mas, sendo
que não tem jeito,
se desse
para escolher,
cada um
pensa dum jeito,
prefere a
morte ou sofrer.
Uns querem a
morte súbita,
liquidar
logo a fatura.
Outros pedem
a doença crônica,
que arrasta
sua asa negra
no diário
desconforto
que
transforma o organismo
num estorvo
requintado,
dolorido e
repisado.
Mas, seja
qual for, a escolha
pode ser
contrariada.
Quem tem
saúde já sabe
que essa
alta é provisória
e que um dia
chega a hora
de baixar
enfermaria.
Quando
adoece, não sabe
se a
morbidez é benigna
– que só
maltrata e não mata –
ou contém malignidade.
Se for
benigna, ainda resta
saber se
crônica ou aguda:
Se tortura
lentamente
ou dói tudo
de uma vez.
Diagnóstico
acertado
também não é
garantia,
pois tem
muita cura em falta
na medicina
hoje em dia.
E o
marketing da saúde,
quando faz o
lançamento
de uma nova
terapia,
logo inventa
nova síndrome,
que conduz
ao consultório
nova leva de
pacientes
que se
tornam portadores
de um novo
mal incurável,
mas que pode
ser tratado,
permitindo
ao pobre diabo
viver quase
normalmente,
se tomar
alguns cuidados
e a sua
ração diária
dos remédios
receitados,
de uso restrito
e continuado.
A doença
leva dor
ao doente e
seu entorno,
que sofre,
por empatia,
de perda
súbita ou dó.
Tem doença
de varejo,
que pega uma
só pessoa.
E tem
outras, de atacado,
que logo vão
produzindo
estatísticas
sinistras
que adornam
o noticiário.
Tem
distúrbio bem discreto,
que causa
uma dor secreta.
E tem os
escandalosos,
que, mais
que ser dolorosos,
maltratam a
criatura
exibindo-lhe
a figura
em situação
humilhante,
enquanto não
chega o dia
de levá-la à
sepultura.
Ter doenças
ninguém quer,
mas ninguém
delas escapa,
seja homem
ou mulher.
E o que mata
um vivente,
para outro
não é nada.
Uns curam-se
do incurável,
outros
partem desta vida
por um
simples resfriado.
Os
tratamentos variam
conforme a
fé do coitado.
Uns creem na
medicina,
outros dela
desconfiam.
Uns querem curar
o corpo
e outros,
desencantados,
procuram,
resignados,
tratamento
paliativo
ou terapia
que ajude
seu espírito
cansado
a resistir
bravamente
ante a
tortura cruel,
sem
esperança de cura.
Seja qual
for a doença,
desconforto
ou agonia,
isso é coisa
de nascença,
que se
aprende desde cedo
a suportar todo
dia.
A cura
definitiva,
a remissão
radical,
por mais
estranho que seja,
é algo que
ninguém quer.
Todos temem
essa hora,
o doente em
agonia
implora por
mais um dia
vivendo na
enfermaria.
Preferem a
recidiva
que a alta
definitiva:
ter seu
óbito atestado
e registrado
em cartório.
Mas
raciocine comigo,
colega de
enfermaria:
Se o corpo
vive doente,
entra e sai
do hospital,
então
livrar-se do corpo
será saúde,
afinal?
Será, viver
neste mundo,
necessário
tratamento
para males
mais profundos?
Estaremos,
talvez,
(− Quem
diria!)
numa grande
enfermaria,
onde uns
tomam remédio,
outros fazem
cirurgia,
alguns
inspiram cuidados
e outros,
mais agravados,
vivem presos
a aparelhos,
monitorados
de perto
pela equipe do
plantão?
Não sei, nem
devo saber
se isto faz
algum sentido.
Cada um sabe
de si
e do texto,
sabe o leitor.
Mas veja se
não ocorre
muita gente
ser curada
de morbidezas
da alma
quando sente
a morte perto,
rondando-lhe
a cabeceira?
Ou quando a
dor lancinante
trespassa o
seu organismo?
Não lhe
parece também
que algumas
chagas da alma
cicatrizam
quando o corpo
em chagas se
desmilingue?
Ou que
algumas pessoas
melhoram
sensivelmente
enquanto o
corpo adoece?
Mas nem
sempre isso acontece,
eu concordo
com o leitor.
Tem quem
sofre e não aprende
e o que
aprende sem sofrer.
Sucede que
se esta vida
for mesmo um
grande hospital,
terapias
alternativas
devem estar
disponíveis.
Que se trate
como quer,
do jeito que
lhe aprouver.
Concordo que
algumas vezes
a gente não
tem escolha,
mas será que
nesses casos
a escolha
foi sendo feita
aos poucos,
devagarinho,
assim
definindo o caminho
que conduz à
enfermaria?
Peço, releve
o leitor
assunto tão
enfermiço,
inda mais
numa hora destas,
em cima do
fim do ano,
quando todos
fazem planos
e formulam
seus desejos
de saúde e
coisas boas.
É que hoje
estou sorumbático,
talvez um
tanto apreensivo,
pensando que
estar no mundo
deve ter
algum motivo.
Mas saibam
que neste corpo,
mesmo que
meio imperfeito,
meu coração
bate forte
em código
Morse afetivo,
mensagens
esperançosas
de quem
busca nas palavras
a cura da
minha alma,
palmo a
palmo com a sua,
nesta drágea
de poesia.
AC- Sampa,
31/12/12.